*Prof. Dr. Antônio Lopes de Sá
Admitir que as normas ditas internacionais de Contabilidade se aplicam por força de lei a todas as empresas é incorrer em grave engano.
Até o momento só as sociedades por ações e as de maior volume de negócios estão obrigadas legalmente a seguir o que determina o normatizado por uma entidade particular, o IASB.
Tais empresas, entretanto, são pouco mais de 1.000 em um universo de 6.000.000 que existem; ou seja, apenas infinitésima parte do universo empresarial está sujeito ao que estabelece a Lei 11.638/07 e mudanças pertinentes defluentes da Medida Provisória 449/08 (esta egressa nesses derradeiros dias do ano, como já parece estar virando hábito).
Não se trata de uma “nova Contabilidade”, mas, de regras de escriturar e demonstrar ao feitio do que delibera uma entidade privada (cuja competência é colocada em dúvida na Europa, inclusive por entidades oficiais da classe contábil naquela Comunidade).
Seria contrariar o lógico, o racional, admitir geração espontânea do dia para a noite, sobre o que ao longo de séculos se construiu.
O que o poder público brasileiro obriga hoje a seguir nesse particular tem explicações históricas que desde a década de 70 advirto em meus escritos e também outros intelectuais como Zeff, Briloff, Fernandes Ferreira, Nepomuceno, Koliver e o próprio Senado dos Estados Unidos.
As referidas Normas não representam uma evolução, mas, acomodações aos interesses dos investidores nas Bolsas, parte esta que é apenas modesta parcela do mercado de trabalho do profissional da Contabilidade.
Todavia, tal a propaganda feita pela imprensa através de entrevistas, tantos os artigos que não esclarecem com a devida sinceridade a questão, de tal forma estão postas tais difusões que as mesmas certo pânico e dúvida ensejaram no meio empresarial, estudantil e profissional (contadores, administradores, economistas, advogados, principalmente); isso o que me permite inferir o expressivo número de mensagens que me chegam telefonicamente, através de minha página www.lopesdesa.com.br (sitio este que já vai aproximando de 3.000.000 de consultas) e de noticiários de uma imprensa internacional independente.
Pontos vulneráveis, motivo de constantes consultas que me fazem, são relativos a temas como: Intangível, Arrendamento Mercantil, Subvenções, Reserva de Reavaliação, Ajustes, Lucros Acumulados, conceitos de Ativo, Passivo, Perdas, Custos, Despesas e outros tantos que sendo vazios não conseguem traduzir a realidade do que desejam expressar, mas, sim a visão subjetiva de quem os emite.
Estabeleceu-se, pela forma que o assunto está sendo colocado, manifesta insegurança.
Como a didática das resoluções da CVM segue a da referida entidade privada IASB e como a desta é deveras de débil entendimento, ampliada pela imprecisão das traduções do inglês, nem sempre fiel à realidade, é natural a dúvida.
Como as normas aludidas não se aferram a lei e nem a ciência (assim está claramente expresso nas conceituações básicas do denominado IRFS), dificultado fica para muitos o bom entendimento da questão (obrigados a seguir a lei e a lei obrigando a seguir as normas).
Alguns professores me perguntam como ensinar diante de tudo isso, das investidas e recuos da legislação; respondo sempre que as referidas normas, por efeito de lei, só se aplicam a minoria de empresas e que devemos ensinar visando à maioria, com respeito à “realidade objetiva”, coisa que as normas nem sempre consideram.
Sugiro que se ensine explicando sobre os danos que a apologia do “subjetivo” pode ensejar através da aplicação das Normas, causando males à sociedade através da deficiente informação, esta que alimentou a crise financeira que atualmente o mundo vive.
Dou ênfase ao fato de que devemos formar “contadores” e não “escriturários” ou “práticos em escrituração e demonstração”; que devemos ensinar o que fazer com as informações e não apenas como se informa.
Destaco como é imprescindível adotar a filosofia do “empreendedorismo” e não a da “especulação”, pois, este é o modelo que está sendo reclamado com ênfase na Comunidade Européia, com reflexos nos Estados Unidos e Ásia; é preciso tomar o caminho da “terceira via”, ou seja, nem o de um fanatismo socialista e nem de um capitalismo canibal; é necessário fazer nítida diferença entre lucro e espoliação, entre realidade e ficção, entre a dita “engenharia financeira” e o “calote” (este que ensejou a crise atual).
O culto professor Valério Nepomuceno, em recente obra lançada pela Juruá editora (Teoria da Contabilidade - uma abordagem histórico-cultural) tece com argumentos irrefutáveis e competentes severas críticas ao movimento normativo; de forma ácida, mas bem justificada afirma que uma “tríplice aliança” é a que sustenta a forte pressão sobre o poder público e o classista, para impor o normativo dito internacional.
Nepomuceno acusa como cúmplices ou componentes da “tríplice aliança” as empresas de atividade especulativa, entidades de classe e auditores transnacionais; ou seja, aponta como componentes do conluio referido um agregado que nisso investe milhões (esse que a imprensa internacional tem destacado com maior insistência após a crise financeira; já na década de 70 o atentado ao mercado havia sido identificado pelo Senado dos Estados Unidos, que utilizou ostensivamente a expressão “conluio” e a de “Contabilidade Criativa”, para em sentido pejorativo acusar e condenar as manobras).
As manipulações, todavia, as dúvidas, são temas que há tempo se arrastam e que possuem todas as chances de continuar face ao que se está implantando e consolidando.
Sobre os “intangíveis”, por exemplo, para citar um só caso, matéria editada em abril de 2000, de autoria de Mikhail Lopes, (http://portalexame.abril.com.br/revista/exame/edicoes/0714/m0051094.html), já fazia comentário deveras polêmico (época em que as normas ainda não tinham sido impostas em nosso País), concluindo que: “Enquanto a academia se debate para decidir os novos e misteriosos termos atrás dos quais serão escondidas as estrelas da Nova Economia, ainda é melhor usar os critérios da velha. Ou seja: do jeito como está é ruim. Se mexer piora.”
Entendo que o autor aludido, ao comentar sobre o tema, procurou conduzir-se como um futurólogo; o que ocorreu depois disso foi a imprecisão; a porta escancarada ao subjetivo irresponsável, editado como regra foi o que deveras acabou por se consolidar, sendo amparo informativo a deflagração de crises financeiras e econômicas que se fizeram sucessivas.
Não justifica, portanto, o alarde que se está fazendo sobre as aludidas normas, pois, legalmente afetam apenas minorias e nestas permitido a deformação informativa.
A Contabilidade como ciência, essa que é competente para guiar empreendimentos sérios, não se deixa tanger por regras construídas por pequeno grupo preocupado primordialmente com a informação bursátil especulativa.
Ademais, é dever ético profissional, por juramento, por princípio, por responsabilidade social, defender a “realidade objetiva patrimonial”, aplicando-se o Contador em ser um orientador, um influente produtor de modelos científicos de comportamento dos capitais, coisa esta que mesmo decorando todas as normas jamais conseguiria um profissional realizar.
*Autor: Antônio Lopes de Sá
www.lopesdesa.com.br
Contato: lopessa.bhz@terra.com.br
Doutor em Letras, honoris causa, pela Samuel Benjamin Thomas University, de Londres, Inglaterra, 1999 Doutor em Ciências Contábeis pela Faculdade Nacional de Ciências Econômicas da Universidade do Brasil, Rio de Janeiro, 1964. Administrador, Contador e Economista, Consultor, Professor, Cientista e Escritor. Vice Presidente da Academia Nacional de Economia, Prêmio Internacional de Literatura Cientifica, autor de 176 livros e mais de 13.000 artigos editados internacionalmente.